Uma carta reincidente

foto: Juane Vaillant



Olhe pra frente. Olhe pra frente.
A frase, dita em meio as ondas, ecoava como um pendulo teimoso em sua cabeça.” Estamos sempre no passado, ou no futuro.” Sim. Ela repetia para si mesma. E estava sempre no futuro. Sempre em futuro muito distante e glorioso. Mas as pessoas a sua volta sempre eram as do passado. Mesmo aquelas que no presente já não importavam, voltavam do limbo na mente para a atormentar, serem perdoadas, ou perdoar.

Sempre que lembrava que não estava olhando para frente -Não para os lados,alto, baixo…  frente! - Ela tirava uma carta. Lia seu horoscopo. Tirava um biscoito da sorte. Ela precisava desses elementos paupáveis que falam do que não se pode ver. O que não se pode provar. O que apenas flui, e vocês escolhe embarcar ou não.

 Dentre todas as predições, dentre todas as possibilidades, a carta a assustava. O As de espada. Sabendo ou não o que significa, só o nome já é forte. Lembrou-se de quando tinha sete anos e aprendia bisca com o seu avô. Ele dizia que na bisca, o “As” e o “Sete” eram as maiores cartas, e foi explicando a hierarquia entre elas.

A menina pegou o As de espadas da mão, e por ai perdeu o resto da explicação. Porque, diferente das outras do baralho, seu simbolo era grande e trabalhado no centro da carta? A primeira coisa que aconteceu, é que ela  começou a acreditar que aquela carta a perseguia. A segunda é que nunca foi realmente  boa em bisca, ou qualquer jogo de cartas. A não ser que tivesse Ela em mãos.

Quando tirou uma carta pela primeira vez, sabendo o que isso significava, foi ela. Aquela mesma. Aquele menino que sempre voltava para sua vida, aparece um dia, com um As, o de espadas, tatuado. No peito.  Na rua,certo dia viu uma caixa com um baralho jogada no chão. Pegou e conferiu, para ver se estava completo. Faltava uma carta. Apenas uma. “Por isso jogaram fora”  pensou.

A carta é uma carta forte. Sobre decisão, mudança, paixão, odio. Uma carta que se reinventava cada vez que ela tirava. Como se ela, num hibrido de  criador e criatura, fosse um mágico, que tem sempre uma carta na manga. Uma carta, que no fundo significasse que, mesmo que ela estivesse com tudo certo e planejado, ainda tinha coisas a serem aperfeiçoadas, lugares a ir, pessoas a considerar e reconsiderar.

Olhe pra frente. Olhe pra fren