Das verdades escondidas


Ela era o tipo de pessoa que não gostava de jogos e indiretas. Ela falava. E sempre fazia questão de deixar tudo vir a tona. "Por que vocês não se beijam logo?", disse, uma vez, a dois amigos que estavam se falando todos os dias há semanas, mas nenhum dos dois tomava a iniciativa. Ela tomou e eles se beijaram.

Ela era assim. Se alguém tinha algum problema com ela e tentasse mandar indiretas, ela ignorava até o dia que acontecesse um encontro casual, nos bares da vida, para ir à pessoa e dizer: "Ei, qual seu problema comigo?". Não sabia esconder as coisas. Talvez, por morrer de medo de ser enganada, é que ela procurava dizer sempre o que sabia, o que pensava.

Ela era a desbocada, a implicante do grupo, a que afastava pessoas por falar coisas que todos preferiam não saber, não encarar. É certo que nem sempre ela dizia verdades por ser "a coisa mais certa a se fazer". Na maioria das vezes, ela via graça, e certo prazer, em perceber que, ironicamente, a verdade incomodava. As pessoas ficavam desconcertadas.

Às vezes, era bom. Às vezes, magoava pessoas. Mas ela não tinha esse crivo, essa moral. Para ela, as coisas não tinham como ser de outra maneira.

Por isso, quando ele disse que iria deixá-lá, ela ficou completamente desestruturada. Menos pelo fim em si e mais por descobrir, numa só noite, verdades que nunca havia percebido antes. E provou da sua própria droga pela primeira vez.

- Você diz sempre o que quer e parece não ler o que está exatamente embaixo do seu nariz. Você bagunça a vida das pessoas e esquece de organizar a sua. Você é inconsequente. Egoísta, prepotente, pedante. Sim, eu te amo apesar de todas essas coisas, porque me apaixonei por uma pessoa que você guarda a sete chaves. Uma pessoa que, por sorte, pude conhecer bem. Mas tem ficado insuportável a nossa convivência e eu preciso ir.

E ele foi embora. Por um momento, ela pensou que tinha sido melhor assim, que estava tudo bem, que ela era maior do que tudo isso e que ninguém era insubstituível. Depois chorou. Muito.

Chorou por dias até perceber que havia chegado a hora de expor seus próprios medos e encarar suas próprias verdades.