A trança


Pensou em escrever uma carta. Segundos depois, a ideia lhe pareceu ruim. Há beleza nas cartas, sim, mas não existe a réplica imediata necessária. Não queria deixar margem para que nada ficasse mal resolvido, já que decidira partir só depois de revisitar todas as suas pendências emocionais. Precisava de paz, então decidiu buscá-la.

Já não havia mais espaço para ela naquela cidade. Era o que pensava. Não que não houvesse espaço físico ou tivesse inimizades demais, mas sentia que só haveria espaço para ela naquele lugar se permanecesse exatamente como estava. E como estava, onde estava, não havia paz. Precisava expandir-se, (re)iluminar-se.

Marcou com ele às sete no bar onde se encontraram pela primeira vez. "Típico", pensou sem se envergonhar por sua tipicidade. No espelho, havia treinado centenas de falas e imaginado as possíveis tréplicas do rapaz. Tentou lembrar das vezes que o magoou e buscou entender sua parcela de culpa em terem ficado tanto tempo sem olhar um para a cara do outro. Mesmo depois de tanto amor.

Estava nervosa. Era como se tudo dependesse daquela noite. Pediu uma longneck e riu lembrando de como ele dizia que ela bebia demais. Não dizia recriminando-a, mas quase a exaltando, elegendo-a. Sorriu e olhou o celular. "Estou chegando", dizia a mensagem.

Mais um gole e se lembrou de como ele foi sensível quando a consolou após ter sido demitida do seu primeiro emprego. Ele a abraçou, limpou suas lágrimas e, sem dizer nada, alisou seus negros cabelos e o trançou. Não que ele soubesse fazer tranças, não que tenha ficado bonito. Mas, lembrando-se daqueles segundos em silêncio e do afeto mútuo daquele momento, os olhos se encheram de água e o coração apertou ansioso por perdoar, ansioso por perdão.

- Ei - o cumprimento do rapaz despertou Ana de seus devaneios.
- Ah, ei. Desculpa - sorriu, meio sem graça. Havia muito que não se viam.

Ele pediu uma dose de conhaque e ela riu ao perceber que alguns hábitos não haviam mudado. Nos dois.

- Bom... - tentou começar, sem conseguir olhá-lo.
- Eu - continuou - vou me mudar. Passar uns tempos longe daqui. E eu pensei muito. E eu achava que deveria...

Ele tocou a mão que segurava, rígida, a pequena garrafa esverdeada. Ao levantar o olhar, notou o sorriso franco e aberto que o enfeitava. Os olhos dela transbordaram. Os dele se encheram. Fechou-os, ela, tentando assimilar o que estava sendo dito naquele silêncio. Perdão. Perdoaram-se.

Permitiu que um largo e tranquilo sorriso estampasse seu fino rosto cheio de lágrimas. E, então, tudo estava em paz.